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Criança Abandonada

(Quadragésima Primeira Comunicação)

            No artigo anterior nos referimos à criança abandonada, uma espécie já extinta, ao menos na interpretação da moderna sociologia. Mas vamos teimar em reconhecê-la como tal. No segundo volume dos Mosaicos da Sociedade Brasileira, Problemas Sociais e Sugestões, como chamamento à importância do assunto ali tratado, há um poema (?) com vista a chamar atenção sobre este grave problema. Vamos reproduzi-lo:   



O ABANDONO DA CRIANÇA ABANDONADA

A consciência social

Reflete na inconsciência individual.

A consciência individual

Reflete na inconsciência social.

E do reflexo de ambas as inconsciências

Emerge o menor abandonado,

Produto de incongruências

Do mundo civilizado.



Que mundo é esse, tão incapaz,

Onde vidas são vividas

Com o sacrifício de tantas vidas?

Onde se fala de paz

E se promove o delinquente?

Onde se prepara a criança

Para o não ser?



“Olho por olho,

Dente por dente.”



E no indiferentismo social

Somos a própria indiferença:

A vista que não vê;

O coração que não se comove;

O ouvido que não ouve;

O braço que não se move;

A boca que não fala;

Enfim, a vida de vida sem sentido

Capaz de criar cruéis aberrações,

Como o da criança abandonada.



Por que abandono

Se o direito à família

É um direito natural?

Simplesmente porque a família

Sofre também a campanha da decomposição,

Embutida em três males irremediáveis:

Na carência de recursos materiais;

Na total falta de princípios morais,

Ou ainda o da antifamília,

Em plena expansão,

Resultado da prática sexual livre,

Da liberdade sem responsabilidade,

“Beco sem saída” da total degeneração.



A família deixa de ser, assim,

A fonte de equilíbrio social

E desarticula-se como instituição.

Há, nesse sentido,

Um processo programado

E meticulosamente seguido ...

E ardilosamente cumprido!...

E o seu produto,

                             A CRIANÇA,

É lançada à própria sorte,

Num mundo hostil e indiferente,

Numa luta prematura pela vida

Em contato permanente com a antivida,

Maior do que a própria morte.

E nesta antivida

Tem o firmamento por teto;

Folhas de jornais por leito;

Sobras de comida por alimento;

O perambular pelas ruas,

Como ocupação;

A promiscuidade,

Por falta de alternativa;

A vadiagem,

Por necessidade;

O analfabetismo, por fatalidade;

A revolta,

Por afirmação;

O isolamento,

Por discriminação;

A desconfiança,

Por não ter em quem confiar;

A perseguição,

Por imperativo social;

O vício,

Por lazer;

A fome e o frio,

Por ingrato destino;

Enfim,

A violência,

Por profissão.



Todo esse quadro

Multiplicado ao infinito,

Não retrata a realidade.



Combater efeitos

Sem procurar causas,

Será prolongar indefinidamente,

Com retóricas aprimoradas,

As imperfeições sociais.



Escola que faz escola,

É violência que gera violência.



E do alto deste abismo

Só se veem dois caminhos:

Ou o despertar da justiça social,

Com o fortalecimento da moralidade dos costumes,

Ou a descida para a decadência,

Antevéspera do total aniquilamento

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